quarta-feira, 29 de maio de 2019

Será que terapia funciona?


Algumas pessoas que procuram a terapia pela primeira vez não sabem exatamente o que ela é, ou o que esperar deste processo. Muitas delas procuram o método por indicação de pessoas próximas ou de outro profissional da saúde, sem saber exatamente como isso pode ajudar. Mas afinal, quais as razões que nos fazem acreditar que a terapia realmente funciona?


Dez motivos pelos quais a terapia realmente funciona

  • Ao compartilhar um problema com o terapeuta, você passa a ter "meio" problema. Dividir sua dor auxilia no processo de alívio da carga emocional e sofrimento.

  • O vínculo desenvolvido na terapia tem poder transformador. Trabalhar nossas questões pessoais se torna muito mais fácil quando contamos com o apoio de uma relação autêntica e respeitosa. A relação terapêutico é uma relação de compreensão, suporte e desenvolvimento.

  • Aquele horário da terapia na semana é o momento onde você pode parar, observar e pensar sobre os rumos que sua vida tem tomado, ampliando assim a reflexão e ajustando as experiências de uma forma mais saudável.

  • O terapeuta representa a figura o outro, com o ponto de vista e perspectiva de uma terceira pessoa. Ele se torna facilitador no processo de reconhecer e olhar para sua própria vida de um modo diferente, lhe propõe questionamentos diferentes aos seus dilemas, lhe ajuda a perceber o universo de uma maneira diferente da que você está habituado, e que antes nem se dava conta.

  • O terapeuta é um profissional preparado com um amplo espectro de técnicas que auxiliam na compreensão do que está acontecendo com você, sendo útil na identificação daquilo que pode estar desajustado em sua vida, bem como na construção de novas direções necessárias e outros rumos possíveis.

  • A partir do seu repertório técnico, o terapeuta pode apontar suas principais questões e, ao descobri-las, lhe ajuda a pensar sobre o que fazer com elas, afim de que tais descobertas possam ser consideradas construtivas em sua vida - não limitantes.

  • O terapeuta está preparado para compreender, a partir do vínculo que vocês estabelecem, os tipo de respostas emocionais que você está habituado a repetir. Em terapia, o profissional se torna instrumento de trabalho para conseguir reconhecer paciente aquilo que você mostra na relação com ele (que geralmente é uma repetição da forma com que você interage com o mundo), podendo assim compreender melhor seus modos de se vincular e de se relacionar.

  • A relação autêntica entre você e o terapeuta se dá como uma espécie de catalisador de mudanças necessárias em sua vida, incluindo incluindo a elaboração de momentos traumáticos e situações inacabadas em relacionamentos anteriores. Isso porque o profissional possui uma sólida base teórica e técnicas capazes de identificar e trabalhar estes afetos desviantes.

  • O terapeuta, além de profissional, também é ser humano. Ele exerce muitos papéis além do de terapeuta, como paciente, como observador, até como aquele que sofre - lugar este que inevitavelmente ainda ocupa. Isso o habilita a "sentir-se em casa" em situações difíceis vividas pelo outro, podendo caminhar por histórias inóspitas e problemas emocionais vividos, no intuito de ajudar seu paciente a encontrar um caminho de equilíbrio, harmonia e até superação.

  • O processo de transformação pessoal vai além do conhecimento técnico formal do terapeuta. Além da formação acadêmica, o trabalho também inclui toda a bagagem pessoal e experiências vividas pelo profissional, o que dá muito mais autenticidade e potência à terapia.

É claro que a lista pode ser ampliada e aprofundada, mas esta foi uma tentativa de ampliar nossa visão sobre os benefícios do processo terapêutico e como ele pode ser realmente eficaz. E você, já fez terapia alguma vez? Ainda tem dúvidas sobre o processo? Vamos conversar!

terça-feira, 28 de maio de 2019

Caso Clínico I - O menino que não sentia

AMARAL, T. Tristeza do menino, 2016.
Havia dito num ar de desprezo para si mesmo: "não dói", da mesma forma que fazia quando criança em dias de vacina, na intenção de disfarçar seu medo e choro para aquelas pessoas da fila. Não suportava a ideia de deixar transparecer sua fraqueza, e optou por acreditar que a dor que hoje sentia era um tipo de vacina que o tornaria mais forte depois. E de tanto dissimular que sentia, foi ficando imune à felicidade. Isento-se dos suspiros, sorrisos, surpresas, ou qualquer outra coisa que tivesse uma duração limitada. Sentia silenciosamente o medo do fim, e tudo que possuía agora era a solidez de uma dor que conseguia esconder de todo mundo ao seu redor - menos de si próprio. Aquela mesma dor, quieta e disfarçada, que mesmo sem alguém perguntar, fazia questão de responder a todo tempo: "não dói".

- A série "Casos Clínicos" é inspirada em atendimentos psicoterapêuticos reais, garantindo o sigilo sobre a identidade e o conteúdo das sessões.

segunda-feira, 20 de maio de 2019

Baixa autoestima pode estar ligada a relacionamentos abusivos

É muito comum encontrarmos associações entre relacionamento abusivo e baixa auto estima. Uma pessoa que não possui muita segurança, atitude e confiança em si, muitas vezes acaba se relacionando com pessoas que oferecem aquilo que lhe falta. Se por um lado pode parecer um conforto e até mesmo a solução, esta relação também pode evidenciar ainda mais estas faltas, facilitando significativamente a possibilidade da relação vir a se tornar abusiva. 


Como se caracteriza uma relação abusiva?

Precisamos entender que relações abusivas são constituídas por pessoas de características comuns. Elas podem ser alegres, sedutoras, aparentar segurança e sabedoria, assim como também podem ser sensíveis, cheias de dúvidas ou pouca segurança. A questão é que há muita dificuldade em identificar perfis abusivos em potencial ou mensurar a probabilidade desse tipo de relação ser experienciada por alguém ao longo da vida. 

O que caracteriza uma relação abusiva é o fato de uma das partes de sentir inferior. O sentimento de desvalorização e intimidação provocam a sensação de dúvida sobre aquilo que sabe ou sente, e a pessoa passa a acreditar que o parceiro é maior do que ela mesma. Há muitos abusos mascarados de atitudes bem intencionadas e palavras afetuosas. O parceiro, muitas vezes, possui um discurso de suporte, de ensinamentos e até mesmo de proteção, porém costuma estar sempre certo e precisa de alguma forma invalidar, desmerecer ou finalizar e substituir por seus saberes e atitudes aquilo que antes era do outro. Porém, desta forma, acabam intimidando, conduzindo e controlando o parceiro, fazendo dele mera sombra. 


Como a autoestima se mostra dentro do relacionamento?

A autoestima de uma pessoa é desenvolvida e estruturada desde o momento do nascimento. É através dos olhares, das falas, dos gestos e do cuidado que vamos formando nossas referências e identificando qual nosso valor. Nossa família e o ambiente social são determinantes nesse processo, e é através deles que sentimos se somos importantes, desejados, se devemos reinar ou nos esconder.

Uma pessoa com auto estima fragilizada é aquela que não consegue identificar o seu real valor. Geralmente apresenta alto nível de insatisfação, seja com sua própria aparência, sua capacidade intelectual ou até mesmo com suas próprias escolhas - sejam do passado ou atuais. Tendem a possuir uma autocrítica severa, focalizando sempre as falas, eros e faltas como parte do processo de auto desvalorização. Podem apresentar dificuldade em identificar suas vitórias pessoais, uma vez que esteja presa nas coisas que poderia ter feito a mais ou de forma diferente, muitas vezes acreditando que o outro é mais valioso ou mais capaz que ela mesma. Não raras vezes, costumam apresentar mecanismos de defesa bastante desenvolvidos, como os de projeção, negação ou distorção.

Não conseguimos identificar apenas uma explicação para este conjunto de comportamentos. O resultado pode ser reflexo do excesso de julgamentos e da falta de reconhecimento do outro, como também do excesso de validação ou dos aplausos em demasia - uma espécie de condição para a pessoa conseguir compreender o seu valor.


Como identificar a autoestima fragilizada?

Existem diversas maneiras de uma autoestima se apresentar fragilizada. Porém, independente de como a fragilidade se manifesta, o ponto central é que envolve uma angústia extrema, provinda da falta do amparo existencial. Por isso, em sua grande maioria, seu discurso e seus sintomas apresentam grandes doses de desmerecimento e ao mesmo tempo a esperança de que alguém o ajude e o encontre, o resgate. Estão muitas vezes à espera (ainda que inconsciente) de um olhar acolhedor, que os reconheça e acalma a angustia. E é justamente desta forma que acabam se expondo e se colocando em situação de vulnerabilidade e dependência, fazendo com que o outro tenha poder sobre ele.

Apesar da face quieta e escondida apresentar sintomas e reações mais comuns e, por conta disso, ser mais facilmente identificada como autoestima frágil, é preciso compreender que o lado aparentemente confiante também pode expressar, muitas vezes, sua fragilidade, através de atitudes disfarçadas como sabedoria, força e coragem. Através dessa fantasia num discurso que mistura culpa e salvação, responsabilidade e ajuda,  a pessoa com baixa autoestima pode acabar se vinculando a alguém inseguro e vitimizado, e com este outro pode acabar tendo uma relação abusiva, uma história cheia de culpa e vitimização.

A relação entre uma pessoa de autoestima frágil e outra que acredita ser dominante, possuidor do poder e da verdade, pode ser tóxica e até mesmo perigosa. Em relações como esta, ao mesmo tempo que cada um provoca no outro seus medos e faltas, também encontra no outro aquilo que precisa, formando assim um ciclo de dependência emocional.


Um problema mais profundo

O fato de se estar em relação abusiva tende a ser um sinal de que a autoestima da pessoa estava fragilizada antes mesmo da relação ser concebida, ainda que não se soubesse. Isso acontece de forma muito mais frequente do que imaginamos. Herdamos uma forte cultura histórica e social que legitima, compreende e estimula diversos abusos e em todos os meios - sendo eles dentro de relações amorosas, familiares ou profissionais - mesmo que mudanças ocorram a cada época, continuamos reproduzindo esses padrões sem nos darmos conta.

O maior perigo de todos talvez seja a normalização dessa situação. Arranhar justificativas como "meu pai e minha mãe faziam isso", ou "antigamente era assim" é autorizar essa realidade e dar a ela um caráter admissível. São nestes esforços com discursos pautados na ideia de normalidade é que se tenta amenizar, compreender ou aceitar abusadores, assim como a ideia de que uma pessoa pode realmente valer mais que outra.

O costume normativo acaba sendo um grande produtor de fragilidades na autoestima pois limitam o ser, o sentir e o existir por si mesmo. Compreender e aceitar determinados contextos por considerar que eles são normais, determina e obriga muitas pessoas a se submeterem conforme as regras sociais, deixando de se perceber, de se escutar e se respeitar. Este cenário também contribui para que a outra ponta do ciclo abusador tenha seu ego reforçado, acreditando que sabem mais, são mais e que podem mais, crenças estas autorizadas e estimuladas socialmente.


Procurando ajuda

Como falamos anteriormente, não há como prever exatamente em que condições um relacionamento abusivo começa a se construir, mas temos fortes indícios que precisam ser observados sempre. Não é normal sentir-se impotente, intimidado ou desvalorizado.

Se você se encontra nesta situação, ou não tem certeza mas que se identificou com algumas destas posturas, falas ou atitudes, não se culpe. É preciso romper com esta herança histórica e social que justifica e aceita o abusador e inverte a situação, transformando o abusado na causa.

É fundamental trabalharmos a autoestima individual, como possibilidade de ressignificar seu próprio valor, consigo e com o mundo. Busque ajuda, fortaleça suas vulnerabilidades. Somente desta maneira será possível reconstruir-se de forma sólida e romper com o ciclo autodestrutivo, fazendo com que o amor próprio e a autoestima sejam restabelecidos. 

terça-feira, 14 de maio de 2019

Quando procurar terapia?

Núcleo Ampliar
Há pessoas que ainda consideram fazer terapia como coisa de maluco e não percebem que corpo e mente funcionam de forma integrada. As dores, o cansaço, a procrastinação e a incapacidade de se decidir diante dos dilemas do dia a dia podem ser sinais de que algo não está indo bem. Por isso, o mais indicado é que se converse com um terapeuta, para que possa ver se há uma necessidade real de se fazer um acompanhamento. Vale lembrar que esta é sempre uma decisão tomada em conjunto, não havendo qualquer obrigação de que a pessoa inicie o tratamento. Para o processo terapêutico fluir de maneira satisfatória e eficiente, é fundamental o desejo e a implicação do paciente.

domingo, 12 de maio de 2019

Suicídio e Comportamento Suicida

Segunda edição do curso sobre Suicídio, promovido pela Comunidade Gestáltica em Florianópolis

Neste final de semana foi realizada a segunda edição do curso de Prevenção ao Suicídio e Manejo do Comportamento Suicida, ministrado pela incrível Karina Fukumitsu, pós doutorada em Suicidologia em São Paulo. Foi uma oportunidade única de compreender melhor os comportamentos autodestrutivos frente à inabilidade de se lidar com o meio. É preciso nos despir do preconceito, dos estigmas sociais, da nossa ignorância limitante, nos vestir com o olhar mais amoroso para conseguirmos acolher o sofrimento daquele que tenta tirar a própria vida. Suicídio não é doença, mas uma solução definitiva para um problema temporário.

"Quando estamos cansados, somos atacados por ideias 
que havíamos superado há muito tempo."

                                            Friedrich Nietzsche

quarta-feira, 8 de maio de 2019

Relacionamentos e repetições

A gente não precisa se arrepender dos relacionamentos anteriores que não deram certo. Mesmo que eles tenham sido ruins, ou tenham trago experiências não muito bacanas, tem algo que é muito precioso nesta vivência dolorosa: ampliação de repertório.

O repertório faz com que aquele determinado sofrimento provindo de uma experiência ruim seja algo conhecido, o que nos dá muito mais propriedade para futuras escolhas - sejam elas amorosas ou não.

"Por que repetimos os mesmos erros"
de J.D. Nasio - Editora Zahar
Eu sei que dói. Eu também sei que a gente não deseja o sofrimento nunca. Mas já que isso se fez presente em algum momento e não conseguimos voltar ao passado afim de mudar o que aconteceu, que tal tentar se apropriar da sua própria história e não permitir que ela se repita? Porque as repetições, sim, são perigosas.

Dica de leitura: Quer saber mais sobre as repetições? Tem muita coisa legal no livro do J.-D. Nasio "Por que repetimos os mesmos erros". Alguns termos são mais técnicos, mas dá pra compreender tudo mesmo não sendo da área.

E claro, como sempre digo: faça terapia!