terça-feira, 14 de fevereiro de 2023

Estar perto não é físico

“A tua mãe me olhando como se fosse tu. Teu rosto no meu rosto. Sinto em mim as marcas da tua face. A tua boca se abrindo é o meu sorriso querendo surgir. Os teus olhos chorando são as minhas vontades que tu também sentiu. Estar perto não é físico.”

Trecho do livro “Os Famosos e os Duendes da Morte” 
de Ismael Caneppele. 2009, Editora Iluminuras.


 

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2023

Apenas comece!

Existem inúmeras razões que podem te impedir de começar algo agora. A falta de tempo e de recursos estão, sem dúvida, entre as mais justificáveis, mas ainda assim é muito importante que você comece. Talvez você já tenha ouvido alguém dizer: "Comece com o que você tem, fazendo o que você pode". Eu sei, o conselho parece clichê e muitas vezes o ignoramos, mas ainda assim, esse pode ser o empurrão que você precisa para dar o primeiro passo.

Ao longo da vida nos deparamos com muitas pessoas que possuem grandes ideias maravilhosas, mas que nunca as trabalharam na prática. E podem existir milhares de bons motivos que as impeçam de agir, mas o fato é que sempre há a possibilidade de tentar de novo, de uma maneira diferente. Muitas das pessoas que admiramos hoje já enfrentaram dificuldades e fracassos ao longo de suas trajetórias. E por conta disso, inclusive, seguimos admirando pela resiliência, perseverança e coragem de cada uma delas.

A vida nos mostra que se você deseja alcançar resultados diferentes, é preciso começar a agir. Por isso, não espere o plano perfeito, o momento exato, a companhia ideal ou o caminho certo, pode ser que essas coisas nunca cheguem.

Coragem, apenas comece!

segunda-feira, 23 de janeiro de 2023

A terapia traz respostas, o terapeuta não

Durante a sessão de terapia, não é incomum o consulente esperar que seu terapeuta lhe traga respostas. Muitas vezes as situações difíceis da vida nos deixam sem saber o que fazer e é natural que surja o desejo por fórmula prontas e roteiros fáceis de se cumprir. Sem perceber, o consulente pode projetar no terapeuta tais desejos e colocar o profissional em um lugar de professor, de mestre, esperando que ele entregue soluções prontas para seus problemas. Só que ao contrário do que muitos pensam, o terapeuta não está ali para trazer respostas. Ele auxilia e estimula a criação de novas possibilidades, contribuindo para que você chegue às suas próprias conclusões sozinho.

O papel do profissional no processo psicoterapêutico é acompanhar o consulente na busca individual pelo autoconhecimento e ampliação de estratégias. O terapeuta é quem pergunta, provoca, instiga, mas jamais responde em seu lugar. A tarefa de encontrar respostas será sempre inalienavelmente sua.

segunda-feira, 16 de janeiro de 2023

Sobre o luto

O luto é o conjunto de reações que o indivíduo apresenta durante o processo psicológico de adaptação a alguma experiência de perda. Quando pensamos em luto, atribuímos à ideia de morte - o que é uma compreensão incompleta. A “morte” neste caso não representa somente o findar da vida, como processo biológico, mas toda perda ou interrupção intensamente significativa para determinado indivíduo.

Podemos nos sentir enlutados em diversas situações, como em um término de relacionamento, na perda de um trabalho, na mudança de território, na alteração de status social ou até mesmo no encerramento de um ciclo da vida. A perda tanto do objeto quanto da ideia daquilo que nos afeiçoamos nos gera dor. E lembrando John Bowlby, quanto maior o apego ao objeto perdido, maior o sofrimento do luto.

Eu sei, sofrimento não é algo exatamente “gostoso” de ser sentido, e por isso podem ser frequentes nossas tentativas de esquiva. Tentamos a todo custo evitar as lembranças daquilo que perdemos para, quem sabe assim, deixarmos de experienciar a falta. Esquecemos, porém, que não há como curar a dor sem mergulho.

Aceite o processo, sinta o que for preciso e dê tempo a si mesmo. Afinal, luto não é esquecer, superar, seguir em frente, mas sim o trabalho de descobrir como se reconectar com aquele que deixou de existir fisicamente, e como continuar vivendo com essa nova forma de vínculo.

sexta-feira, 30 de dezembro de 2022

Vulnerabilidade é sinal de fraqueza?

Muitas pessoas associam vulnerabilidade com fraqueza, insegurança, incapacidade ou medo. Historicamente, nossa busca pela perfeição e omissão das próprias fragilidades estão ligadas à necessidade evolutiva de sermos aceitos e amados. Porém, se mudarmos a forma como a encaramos, poderemos enxerga-la como um caminho para a plenitude e não para a tempestade, sem precisarmos comprometer nossa necessidade de afeto. Ter a coragem de ser imperfeito, ser gentil consigo mesmo e ter auto compaixão é o melhor caminho para diminuir as próprias angústias. Quem consegue abraçar sua vulnerabilidade vira uma chave e vê na “fraqueza” uma oportunidade de crescimento, autonomia e libertação.

sexta-feira, 23 de dezembro de 2022

Despedida de 2022

Gabinete Real de Leitura (RJ)

Hoje eu encerro meu último dia de atendimentos do ano. Aqui, neste consultório de onde escrevo, tantas histórias foram contadas e afetos compartilhados também. Me emociona lembrar das coisas que passamos juntos neste espaço, e saber que todas elas dão contorno e sentido ao meu trabalho. Meu 2022 foi um ano de muito amadurecimento e consolidação profissional, e sei que nada disso seria possível sem a confiança, a disponibilidade e a entrega de cada um ao seu próprio processo terapêutico.

Escolhi essa foto por ser tão afetiva pra mim. Este é um registro do Gabinete Real de Leitura do Rio de Janeiro, cidade onde participei pela primeira vez do encontro interestadual de Gestalt-terapia. Ao meu redor, um universo infinito de palavras, estas que hoje são meu maior instrumento de trabalho e acalento.

Me despeço desse ano também com as palavras, mas desta vez, da grandiosa Nise da Silveira, que tanto ecoaram por aqui e que com certeza (direta ou indiretamente), reverberaram nos atendimentos também:

“É necessário se espantar, se indignar e se contagiar.
Só assim é possível mudar a realidade.”

Que neste próximo ano possamos nos encontrar novamente, com muito espanto e muita indignação, e que a potência dos afetos siga nos contagiando!

Obrigada, obrigada e obrigada mais uma vez.
Pode vir, 2023! ✨🥂🍾

quarta-feira, 7 de dezembro de 2022

Saramago, o agitador de consciências

arte: @gustavogontijoart

José Saramago foi, sem dúvida, a voz mais notável das letras portuguesas. Sua faceta de homem comprometido sempre o caracterizou muito bem, e a excelência de sua escrita lhe trouxe um prêmio Nobel e outros tantos. Assim, grande parte das suas obras se lançam como veículo excepcional para a catarse e a reflexão filosófica, um legado que nos convida para o “despertar”.

Frequentemente, dizem que Saramago foi um agitador de consciências. Nunca parou de denunciar injustiças e de se posicionar perante qualquer conflito de sua época. Por isso, em uma de suas palestras, ele definiu a si mesmo como um escritor apaixonado, alguém com a necessidade de levantar qualquer pedra, mesmo sabendo que embaixo poderiam estar escondidos verdadeiros monstros.

Foi o escritor mais ilustre que Portugal nos ofereceu, juntamente a outros autores como Fernando Pessoa. Saramago é responsável por uma obra provocativa, mágica e inquietante que nos convidou a analisar o presente é a nós mesmos através de seus olhos.

"Dentro de nós há uma coisa que não tem nome,
essa coisa é o que somos”
Trecho do livro Ensaio Sobre a Cegueira, em homenagem ao centenário de José Saramago.

terça-feira, 6 de dezembro de 2022

Quais amanhãs queremos?

Museu do Amanhã (RJ)
"Que Amanhãs queremos construir? Amanhã é hoje. Hoje é o lugar da ação". Me deparei com essa mensagem incrita num grande globo de led, projeto do arquiteto espanhol Santiago Calatrava, em uma visita ao Museu do Amanhã, no Rio de Janeiro. Saí de lá pensativa, sensibilizada com a provocação.

Quando refletimos sobre passado, presente e futuro, percebemos como os seres humanos são parecidos uns com os outros - ora em apoio, ora em batalha. Se considerarmos a justificativa de que o ideal é que nos conectemos por aquilo que temos coletivamente, por que não lutamos pela construção de uma sociedade melhor e mais justa? Por que não procuramos viver em harmonia, num espaço onde possamos cuidar uns dos outros com segurança e dignidade? Investir em algo que nos que nos faça sentir inteiros e nos dê alguma certeza de que viver ainda pode valer a pena?

O futuro está em nossas mãos. Mais que uma noção de tempo, o amanhã é uma construção, e que começa no agora. Como sociedade, nosso maior desafio será pensar em novos caminhos para navegarmos entre aquilo que somos e aquilo que podemos vir a ser. É responsabilidade de cada um explorar as mudanças do momento em que estamos vivendo e dos possíveis rumos para a construção do amanhã que queremos.

Não esqueçam, o amanhã é hoje.
E hoje é o lugar da ação!

Nós somos o que postamos?

Quando perguntam se nós somos o que postamos, não é porque devemos ser completamente transparentes nas redes sociais, muito menos nos expor de modo negativo, com fotos tristes ou fatos pesados sobre nós mesmos. A pergunta, na verdade, é para gerar reflexão sobre que tipo de conteúdo estamos produzindo, se não estamos rendidos a um automatismo que só contribui para uma imagem idealizada de nós mesmos.

Por que nos machucamos com tantas comparações quando todos nós enfrentamos problemas, dias ruins, sentimentos desanimadores, e nenhum de nós têm a vida perfeita que postamos nas redes sociais? A verdade é que se fossemos mais honestos conosco e com o mundo e compartilhássemos da nossa vulnerabilidade, muitas pessoas também se sentiriam encorajadas para tirar esse peso dos ombros e terem uma vida mais leve - inclusive você.

segunda-feira, 28 de novembro de 2022

Nossa criança interior

arte: @anna_cunha
inspirada por Milton Nascimento

Na psicologia, o conceito de “criança interior” é um termo usado para definir a parte íntima, ligada às crenças e aos afetos que foram construídos na infância. Em maior ou menor grau, essa criança que fomos ainda carrega em nós seus anseios e carências. A necessidade de amor, cuja falta vem da infância, é responsável por muitas tendências autodestrutivas e insatisfações nas relações pessoais. Essa criança precisa ser cuidada para o equilíbrio da nossa vida emocional.

A criança interior é o resultado de experiências vividas desde o momento da concepção até o final da infância. Dependendo do que você recebeu dos pais e do ambiente em que se desenvolveu, sua criança interior pode trazer em seu íntimo criatividade, alegria, intuição, sensibilidade, mas também rancor, medos, culpa, solidão, desamor, obsessões, etc.

A criança interior é tão importante que a consideramos a mais fiel representação de quem somos, pois nossos impulsos são amplamente influenciados pela percepção que a criança interior tem da vida.

"Em todo adulto espreita uma criança – uma criança eterna, algo que está sempre vindo a ser, que nunca está completo, e que solicita cuidado, atenção e educação incessantes. Essa é a parte da personalidade humana que quer desenvolver-se e tornar-se completa" (Jung, 1981)